Já vos aconteceu comprarem um brinquedo caríssimo e o vosso filho gastar muito mais tempo a brincar com tupperwares? Ou oferecerem um brinquedo incrível ao vosso filho e ele interessar-se mais pela caixa onde vinha o brinquedo, do que pelo próprio brinquedo?
As crianças têm esta capacidade de ver num simples objecto (sem valor aparente para o adulto) a oportunidade de criar e construir o que elas quiserem. Ao contrário de um brinquedo “já feito”, que tem as suas explorações limitadas, uma caixa de cartão pode transformar-se no que a criança quiser: um avião, um carro, uma casa, um castelo!
Estes são os brinquedos não estruturados – os materiais de fim aberto ou peças soltas. Estes oferecem a oportunidade de serem transformados pela criatividade da criança, naquilo que ela quiser.
Estes brinquedos podem incluir coisas consideradas lixo, desperdício ou materiais do dia-a-dia. Tais como: terra, areia, água, pedras, conchas, sementes, madeira, galhos, folhas, flores, palitos, botões, rolos de papel higiênico, rolhas, potes, colheres, tampas, pratos, canecas, tecidos, discos e blocos de madeira, caixas… Ou seja, qualquer material que a criança consiga manipular e utilizar para vários fins.
Estes brinquedos permitem à criança uma muito maior entrega, uma vez que a criança tem de construir o brinquedo, para depois brincar. Por isso é que as crianças dedicam sempre bastante mais tempo a este tipo de brinquedos, do que àqueles que já vêm “prontos”. Construir o seu próprio brinquedo é muito mais interessante e estimulante, do ponto de vista da criança.
Quais são as vantagens destes “brinquedos”?
Os brinquedos não estruturados aumentam o repertório criativo e inventivo da criança, que tem de atribuir significado às suas criações. Estes brinquedos exigem construção por parte da criança. Exigem que ela, não só execute, como pense, pondere, planeie. Porque não é o adulto que determina a fantasia, mas sim a imaginação da criança. É a criança que atribui significado ao brinquedo e ao brincar.
Brinquedos não estruturados permitem um número ilimitado de brincadeiras e de criações. Por isso, estimulam a inteligência e o desenvolvimento cognitivo, uma vez que a criança precisa de utilizar recursos cognitivos tais como a organização, o planeamento, a flexibilidade, a criatividade, a atenção, a memória, a resolução de problemas, o pensamento lógico e matemático… Permite à criança desenvolver as suas noções de conceitos opostos, os seus conhecimentos sobre medidas, pesos e tamanhos.
Estes brinquedos estimulam a motricidade fina, uma vez que a criança utiliza sempre os seus dedos, as suas mãos, os seus pulsos, os seus antebraços e os seus braços para construir, destruir, reconstruir… e criar.
As crianças que brincam com peças soltas estimulam até as suas competências emocionais e sociais, tais como a responsabilidade, a cooperação, a independência, a auto-regulação, a autonomia.
Nestas brincadeiras, o processo é mais importante do que o produto final, e o reforço positivo está intrínseco à actividade. O brincar em si já é um reforço positivo. O objectivo não é o final da brincadeira e o seu resultado, mas o seu processo – é aí que acontece a aprendizagem
No brincar com peças soltas que é dirigido pelas crianças, elas exploram a brincadeira de acordo com o seu nível de desenvolvimento. A brincadeira nunca é exigente demais, nem fácil demais, uma vez que a criança não se propõe a desenvolver uma actividade para a qual ainda não está preparada, mas, ao mesmo tempo, desafia-se. E faz isto sem a interferência do adulto. Fá-lo pelo simples prazer de brincar.
Toda esta magia está envolvida neste processo de estruturar o não estruturado.
E como é que a criança brinca com brinquedos não estruturados, materiais de fim aberto e peças soltas?
Exactamente como ela quiser. Pode fazer música e ritmos, com panelas e paus. Pode desenhar na areia, esconder e encontrar brinquedos, qual pirata em busca de um tesouro. Pode empilhar blocos e fazer torres e castelos. Pode ordenar, contar, alinhar. Fazer sequências e padrões. Pode experimentar os movimentos diferentes que tem uma pedra redonda ou uma forma cilíndrica, de uma pedra achatada. A criança pode brincar aos transportes, aos animais, às profissões – porque os blocos de madeira, as pedras e os paus podem ser um avião, um cavalo ou um sapato. A criança pode fazer de um tubo de papel higiénico um objecto de escuta secreto, ou um monóculo. Paus com fitas e tecidos podem transformar-se na mais bonita das bonecas. E a terra? Hmmm, dá bolinhos deliciosos! A criança pode, por si, criar o que quiser, e explorar os diferentes sons, as diferentes cores, os diferentes cheiros… as diferentes sensações.
Nesta época em que tantas mensagens recebemos com a pergunta “qual o presente ideal?”, este é o nosso conselho: ofereça brinquedos não estruturados. Além de todas as vantagens já enumeradas, ainda são grátis!
E lembre-se disto: mais importante do que o brinquedo é a qualidade do brincar.